Amados irmãos,
A escolha do meu nome para este cargo e função, gerou um misto de alegria e profundo senso de responsabilidade; satisfação pela confiança depositada junto ao temor e tremor diante de Deus visto começar hoje um novo capítulo da minha história nesta Casa de Profetas.
A relação com este Seminário teve início no ano de 2000, mais especificamente no 2º semestre. Meu pai estava no 1º ano do curso de Teologia, tinha acabado de comprar um Ford Escort 1990 e viria, pela primeira vez com aquele veículo, ao Seminário para fazer prova de Inglês instrumental. Por esse motivo, convidou-me a vir com ele sem saber que, naquele dia, eu teria uma aula prática sobre o valor agregado da vocação e do conhecimento antes mesmo de chegar ao Seminário.
Segue a explicação: como todo bom carro velho, ao descer da ponte Rio-Niterói, começou a tremer de um jeito diferente e se engasgar. Paramos definitivamente frente à escola de circo, próximo à Praça da Bandeira. Era cerca de 6h30min da noite, o carro não tinha seguro, não tínhamos telefone celular – há 22 anos poucos possuíam um. Atravessamos a pé a passarela em direção ao outro lado, buscando uma oficina, mas quase todas estavam fechadas. Pela graça de Deus, entretanto, havia uma ainda quase fechando as portas. Meu pai falou com o mecânico e este, apesar do expediente já encerrado, foi até nosso carro conosco; chegando lá, abriu o capô e meu pai ligou o carro tentando dar a partida. Em seguida, abriu o carburador, tirou duas peças, deu um sopro em cada uma resolvendo o problema. Meu pai quis saber o valor da despesa e quase caiu duro quando ouviu do mecânico: “São cinquenta reais.” Meu pai perguntou de novo: “Quanto?”. O outro repetiu o valor: “Cinquenta reais.”
Hoje tenho plena consciência de que não se tratava do sopro em uma peça, mas de saber qual a peça avariada e o que precisava ser feito; do tempo dispensado à preparação e ao estudo.
Ali aprendi a importância de se valorizar o conhecimento, seja técnico ou acadêmico científico, tanto quanto a experiência de vida, experiência com Deus e relacionamento com o próximo. Na multiforme graça de Deus, ele tem fonte inesgotável de conhecimento e sabedoria.
Daquele dia em diante, quando havia oportunidade, acompanhava meu pai em suas aulas. Primeiro, por uma preocupação filial de estar com ele em possíveis situações semelhantes a que o tinha feito perder sua prova – e, Deus sabe, que a carga horária gasta em engarrafamentos, em esperas no pedágio e em “blitz” sem sentido foi maior do que a de Teologia Sistemática.
Aos poucos, porém, tornei-me ouvinte de palestras especiais, de semanas teológicas, de sermões de prova e de boas aulas. Servi como organista substituto na capela. Em Constituição e Ordem fiz prova e em Administração Eclesiástica ganhei até certificado! Mesmo tendo sido despertado ainda no início da adolescência, àquela altura estava convicto de que tinha a mesma vocação do meu pai.
Na histórica Reunião do Supremo Concílio em 2002, enquanto o Rev. Roberto Brasileiro era eleito presidente pela primeira vez, eu deixara um pedido pendurado em letras garrafais na porta do gabinete do meu pastor, para ele ler claramente quando voltasse daquela reunião: “Por favor, preciso que o senhor assine a declaração de minha condição de membro da igreja para enviar ao Seminário”. Insisti por dois dias. Eu só tinha 16 anos e, por isso, ainda não almejava o Seminário Presbiteriano, mas um curso básico de Teologia na então Escola de Pastores em Niterói.
No primeiro dia de aula, fui o primeiro a chegar. Meu primeiro professor tinha sérios problemas auditivos – não usava aparelho auditivo e, por isso, falava bem alto, a ponto de mesmo ele estando na secretaria e eu na sala do fim do corredor, pude ouvir com clareza: “O quê? Um adolescente? Não vai ficar. Mas, deixa, deixa”. Deixaram e eu fui um dos 3 únicos que concluíram o curso de uma turma de 12.
Concluído o curso, estava certo de que meu lugar era no Seminário Presbiteriano. Em 2004 terminei o primeiro ano de minha graduação em História o que aumentou a certeza de que precisava também estar aqui nesta casa. E assim foi: cursei História e Teologia ao mesmo tempo a partir de 2005.
Não poderia deixar de mencionar minha gratidão à Igreja Presbiteriana do Sinai e ao seu então pastor, Rev. Simonton Rédua. Foi aquela pequena Igreja, mais simples, com menos recursos do que a minha igreja de origem que acreditou na minha vocação e me acolheu como filho. Concluído o seminário, aprouve a Deus colocar-me de forma inesperada e inusitada em outra Igreja, a 1ª Igreja Presbiteriana de Niterói, onde a comunidade e o Rev. Fernando Pereira Cabral, um amigo e pai espiritual, também me acolheram, sendo instrumento de Deus para minha ordenação ao ministério. Ali, desde novembro de 2009, tenho servido e experimentado o quão Deus é soberano e providente.
Algo sempre me impulsionava à Teologia e ao preparo acadêmico porque compreendia a necessidade de aprender para compartilhar, de receber para transmitir. Segui os estudos e consegui a especialização em Teologia pelo Andrew Jumper. Em 2011, cheguei a esta casa como professor tornando-me colega e amigo de antigos mestres como o Rev. João Batista Borges, Rev. Isaías Cavalcante, Rev. Otávio Henrique de Souza, Pb. José Roberto da Silva Costanza e Rev. Adelino José. Tudo isso, porém, ainda não era o bastante. Sentia que precisava continuar.
Durante uma mensagem trazida ao nosso Seminário, o Rev. Roberto Brasileiro aconselhou aos pastores que fizessem mestrado depois de uns 5 anos de ministério, mas já era tarde, pois eu já havia concluído os Mestrados no Centro Presbiteriano Andrew Jumper (Teologia Histórica) e na Faculdade de Formação de Professores da UERJ (História Social).
Em minha trajetória acadêmica, também sou muito grato à Profª. Dra. Joana Bahia, amiga preciosa, instrumento de Deus em minha vida, que gentilmente me convidou para o Doutorado e me inspirou a concluí-lo.
22 anos se passaram desde a primeira vez em que estive no Seminário pela primeira vez. Hoje, diante da Junta Regional, das demais autoridades da IPB, do corpo docente e do corpo discente, de nossos colaboradores e de tantos amigos e irmãos, assumo o compromisso de, como diretor deste Seminário, dar continuidade ao trabalho de meus antecessores, dentre eles o rev. Romer Cardoso, diretor e amigo, o qual, caminhou comigo nos últimos 6 meses de transição.
Em tão pouco espaço de tempo, não seria capaz de mencionar todos os nomes que merecem ser mencionados. Como bom presbiteriano, contudo, escolhi três menções especiais: a ex-presidente nacional de SAF’s, Sra. Anita Chagas, cujo exemplo foi uma escola e cujas mensagens falaram ao meu coração porque Deus a usou; meus pais amados, Sergio e Leide, que incessantemente intercedem por mim diante de Deus; e, como não poderia deixar de ser, meu principal motivo de gratidão, depois de nosso Jesus: Jessica, minha esposa, fruto da benevolência do Senhor em minha vida, aquela que me conhece como ninguém, presente de Deus junto com meu filho Benjamin.
Temo que um dos grandes desafios da Educação Teológica contemporânea seja lutar contra a nova roupagem da heresia pelagiana: a da salvação pela obra teológica, mediante a profissão de fé confessional. Não se trata de pensar dentro ou fora da caixa, como alguns tentam superficialmente indicar. Trata-se de não encerrar Deus em uma caixa, como se pudéssemos fazê-lo. Trata-se de não criar uma divindade à nossa imagem e semelhança, um ídolo feito conforme o que queremos crer e fazer sob o nome de deus.
Precisamos retornar ao temor do Senhor como princípio da sabedoria, pois somente o conhecendo tal como ele se revela em Jesus e em sua Palavra poderemos nos conhecer e ter verdadeira piedade.
O Seminário Simonton é confessional e entendemos serem as Escrituras nossa única e infalível regra de fé e prática. E tão somente ela. Não é à toa que nossos pais espirituais de Westminster legaram-nos a instrução de que “há algumas circunstâncias, quanto ao culto de Deus e ao governo da Igreja, comum às ações e sociedades humanas, as quais têm de ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência cristã, segundo as regras gerais da palavra, que sempre devem ser observadas” e ainda que “todos os sínodos e concílios, desde os tempos dos apóstolos, quer gerais quer particulares, podem errar, e muitos têm errado; eles, portanto, não devem constituir regra de fé e prática”.
Nesse sentido, entendo a necessidade da defesa dos três pilares fundamentais que têm sido o diferencial de nossa instituição: 1º) zelamos pela Teologia Reformada que une o que há de melhor da reflexão e da sistematização teológica ancorada na fidelidade bíblica. Teologia para a vida. Uma cosmovisão; 2º) como o Seminário é uma parte da igreja de Cristo, valorizamos a piedade porque é o temor do Senhor o princípio da sabedoria e porque fomos irresistivelmente vocacionados pelo Espírito Santo à íntima comunhão com o Pai, mediante Jesus, o Filho. Isso envolve amar a Deus e ao próximo, tanto o crente quanto o não crente.; 3º) como casa de profetas, praticamos a proclamação do Evangelho porque anunciamos com tudo o que somos, falamos e fazemos dentro e fora de sala de aula, que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus o Pai. Sem ele, não há salvação. Ele é o único mediador entre Deus e os homens e todo aquele que nele crê não perece, mas herda a vida eterna a qual começa aqui, com uma vida abundante no Espírito.
Conto com a intercessão dos irmãos e com o apoio de cada um. Que Deus me ajude a servir aos nossos alunos, professores e colaboradores! Que somente a Deus seja a glória!
Rio de Janeiro, 01 de dezembro de 2022.
Rev. Sergio Tuguio Ladeira Kitagawa